18/12/2018 às 15h11min - Atualizada em 18/12/2018 às 15h11min
Djavan tem obra levada para a Jamaica em disco que balança ao 'djahvanear' o que há de bom no ritmo do reggae e do ska
g1.com.br
Anunciado em janeiro com o single em que Chico César canta a balada Nem um dia (1996) na cadência do reggae, o álbum Jah-Van – Djavan goes Jamaica foi aguardado com expectativa ao longo deste ano de 2018.
Com edição atrasada por conta de questões jurídicas relativas à liberação de fonogramas, o disco chega enfim ao mercado neste mês de dezembro, trazendo dez títulos da obra do compositor alagoano para o universo musical jamaicano. E, por música da Jamaica, entenda-se sobretudo o reggae, o ska e o lovers rock (subgênero do reggae que tende para o romantismo).
Na capa idealizada por Humberto Freitas para o projeto fonográfico produzido por BiD com Fernando Nunes, Djavan aparece retratado como legítimo rastaman, com as tranças que identificam visualmente os seguidores do movimento rastafari.
Contudo, Djavan em si figura no álbum somente como compositor. Coube a um time eclético de intérpretes cantar as músicas do artista no ritmo jamaicano, djahvaneando o que há de bom em universo do qual a obra de Djavan sempre esteve afastada.
O resultado é bom sem ser arrebatador. Há grandes faixas, como o single antecipado em março com o registro de Meu bem-querer (1980), canção amaciada na voz aveludada de Seu Jorge na cadência do lovers rock, com o aditivo do rap de Gustavo Black Alien e com o toque dos metais de Maestro Tiquinho.
Sina (1982) também ressurge bem no ritmo do ska e na voz cavernosa de Arnaldo Antunes em gravação temperada com rap improvisado por Rincon Sapiência com nomes de outras músicas de Djavan. Entre elas, Azul (1982) e Lilás (1984).
Aliás, Lilás também tangencia o passo veloz do ska em gravação que reúne Ivete Sangalo e Zé Ricardo (ele em cores vocais mais vivas do que ela). Já Azul fica com tons bem clarinhos na cadência romântica do lovers rock e na voz de Fernanda Abreu, cantora de visão moderna que está à vontade no disco, mesmo sem roçar o brilho da cintilante abordagem de Azul feita por Gal Costa no corrente show A pele do futuro.
Azul, Lilás e Sina balançam em outro ritmo, mas conservam o suingue, uma das marcas mais fortes do cancioneiro singular de Djavan. Em contrapartida, Esquinas (1984) reaparece quase irreconhecível em registro instrumental e se revela a faixa mais ousada (embora, talvez por isso mesmo, a de resultado menos sedutor) de Jah-Van, disco coproduzido por Kuki Stolarski.
Primeiro porque a releitura de Esquinas dilui a densidade desta música cujo teor emocional é um dos mais altos dentro da obra de Djavan. Segundo porque omite a letra tão indissociável da música. De todo modo, cabe ressaltar o mérito de Maestro Tiquinho e dos músicos da Jah-Van Band – que assinam a faixa – de se descolar totalmente da matriz original do compositor.
Em rota inversa, Açaí (1981), por exemplo, tem preservado quase todo o sabor original no dueto de Zélia Duncan com Assucena (metade vocal d'As Bahia e as Cozinha Mineira), ainda que a marcação do b
aixo de Fernando Nunes – nessa e em outras gravações – evidencie se tratar realmente de um disco de reggae e das variantes do gênero.
Essa sensação é reforçada pela abordagem roots do rapper sambista Criolo em Cigano (1989) – única musica mais difícil da seleção de hits – em gravação feita com a adesão do grupo jamaicano The Abyssinians.
A arregimentação de Thales “Lion Farmer” e Rafael Senegal – guitarrista e tecladista, respectivamente, da banda de reggae Leões de Israel – para o time de músicos do disco corrobora o fino e adequado acabamento instrumental de Jah-Van – Djavan goes Jamaica.
A viagem transcorre geralmente agradável, mas sem apresentar uma gravação que se imponha instantaneamente emblemática, sinalizando que Djavan ainda soa melhor no sofisticado universo particular do compositor. (Cotação: * * * 1/2)