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01/11/2019 às 12h12min - Atualizada em 01/11/2019 às 12h12min

Violação semântica, distopia social e os fariseus de toga


As abelhas, as formigas e os seres humanos têm uma característica comum, isto é, todos são gregários. Vivem e precisam viver em comunidade para subsistir, alimentar-se e proteger-se de predadores. Para viver em comunidade é indispensável um conjunto de códigos, regras e delimitações. Caso contrário, fica inviável a cooperação e ajuda mútua de modo a viabilizar a existência do grupo.

Não sei, tampouco interessa, quais são os instintos inatos das formigas e abelhas para viver em bando. A mim, só interessa o critério que nós, seres humanos, usamos para tornar a vida em comum possível. E qual código ou conjunto normativo é esse? É simplesmente semântica. Isto é, formamos signos (palavras ou marcação sonora pela fala) e atribuímos a essas marcações algum sentido.

Por exemplo, quando existe determinada placa de “PARE” em um entroncamento de ruas é ponto pacífico que todos entendem que devem parar seus automóveis, verificar ao redor de modo a evitar uma colisão e dar prioridade a quem está na via principal. Essa questão do trânsito está sendo usada aqui como mero recurso didático para explicar quão delicada e fundamental é a uniformidade semântica das palavras.

Não estamos defendendo que é ilegítimo uma interpretação das palavras, frases e comandos de forma inovadora ao que habitualmente se entendia ou pensava. Interpretar é o ato mais sublime e humano da linguagem. É justamente a interpretação que nos diferencia dos demais animais que são meramente instintivos. O que pregamos aqui é que as palavras têm sim uma carga semântica mínima que não pode ser transposta ao alvedrio do intérprete ou outra comodidade.

Feitas essas breves observações, vamos nos atentar ao artigo 226, § 3º da Constituição Federal que diz “Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” Veja-se que existe um limite semântico mínimo nas palavras homem e mulher que não pode ser transpassado pelo hermeneuta.

Está mais do que claro que o texto da Constituição precisava de uma revisão compassada com os atuais valores sociais eleitos como importantes de modo a tornar possível o casamento e a união estável homoafetiva dando-lhe o mesmo tratamento legal que casais heterossexuais têm.

A questão é que a liturgia para fazê-lo precisava naturalmente de emenda constitucional oriunda do parlamento. Ou seja, não é possível fazer essa atualização por meio de interpretação, mas apenas por nova estrutura textual com respectiva carga de significado. O congresso deveria ser mais pressionado pelos mais variados setores sociais para então promover a alteração na Constituição Federal.

Ao arrepio da liturgia, em 2011 por meio da ADI nº 4277 e ADPF nº 132, o Tribunal que tem, em tese, a missão de ser justamente o guardião da constituição é quem inicia o caos hermenêutico gerando todo tipo de distopia social e verdadeira insegurança jurídica multilateral.

O problema sobre a indefinição de possibilidade ou obrigação de prisão após condenação em 2º grau é sintomática da patologia interpretativa cuja gênese se opera em 2011 com a equiparação da união estável entre homem e mulher a união estável entre homem e homem ou mulher e mulher. Esse debate sobre impunidade é necessário e salutar, mas não podemos combater a impunidade fazendo interpretações que não observam a carga semântica mínima das palavras.

Quando a Constituição Federal no art. 5º LVII diz que “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória” existe claro limite semântico que o intérprete não pode transbordar. Vemos então alguns juízes togados se transformarem em verdadeiros fariseus gerando descrédito institucional e perdendo completamente a autoridade que é inerente ao cargo. Isso é ruim para todos e gera o colapso de estruturas sociais fundamentais para a manutenção da ordem coletiva.

Voltando ao exemplo do trânsito, se o motorista não para diante da placa “PARE” e segue sem qualquer atenção a consequência é a colisão de veículos; se o juiz entende “sim”, quando na verdade o texto legal diz “não” a sociedade cai em desgraça.  

Por Lucas Bonfim
 
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